segunda-feira, 7 de dezembro de 2020

Emoção Artificial

 


Emoção artificial é melhor do que nenhuma.
- Me dá uma recarga de bateria que eu faço amor contigo.
- Posso mudar a tua voz na próxima vez?
- Certamente que sim!
Desconfiaram? Casal do tipo humano e robô. Estranharam? Conte aí alguns míseros anos e os robôs serão uma mercadoria que, além de conversar, fazer caras e bocas, sexo e muito mais, serão capazes de despertar a paixão nos humanos.
A perspectiva desse avanço tecnológico até que não me assusta, diante dos avanços em outras áreas da ciência, mas confesso que a manchete, “os robôs serão os melhores amantes” , me deixou um tanto perplexa. Agora, então, eu posso me dar ao luxo de imaginar qualquer coisa. O futuro? Homem mais mulher igual a coisa do passado. Filho, questão de laboratório, e, de preferência, silenciados os genes para características desinteressantes. Namorar será cafonice, e casamento, depois dessa inovação na robótica, cada vez mais coisa do passado, ou de poesia, sei lá.
Vou dar um passo maior (ou mais profundo?) e perguntar: Por que a inteligência humana desenvolveria robôs na expectativa de transformá-los em amantes? Podendo ser programados para ter qualidades “x”, então poderíamos nos apaixonar por eles? Será mesmo? Como programar um sentimento direcionado para uma pessoa específica, se, deste sentimento, desconhecemos a essência? (Conhecêssemos a essência do amor, e não estaríamos a inventar novidades). Estaríamos, na verdade, esvaziados da emoção a ponto de reinventá-la, ou seriam esses robôs apenas uma brincadeira sexual mais elaborada?
Diz a manchete que os robôs têm um lado prático, por exemplo, o de acabar com o problema da prostituição e das doenças sexualmente transmissíveis (as traições em carne e osso?), mas imagino o homem dizendo:
- Você já transou com um robô?
E ela voltando ao tempo da mentira, porque, afinal, quem que vai querer concorrer com um mancebo cibernético?
Eu já me sinto atrasada no tempo. Pensar que será possível comprar “alguém”, mesmo que com emoção artificial, usando da mesma naturalidade com que se compra um congelado, ainda me parece um absurdo. Fazer o que, se eu sou do tempo dos humanos?
Corri a contar a novidade para a minha filha, que é jovenzinha e, possivelmente, mãe da primeira

“É... emoção artificial é melhor do que nenhuma...”.
Eu só fico me perguntando se será possível, em algum tempo, unir a engenharia genética com a robótica, e fazer um sujeito meio a meio, entende? Que não me venham chamar de Cissa Frankenstein, porque, como eu disse, depois dessa de que “os robôs serão os melhores amantes”, eu me permito imaginar qualquer coisa.
Cissa de Oliveira
(1) David Levy - Revista ÉPOCA n°. 500 - pg 126

Crônica do meu livro "Uma sujeita esquisita" (2009).



domingo, 11 de setembro de 2016




Uma tarde mais do que especial na Terceira Feira do Livro Campinas Shopping, 27 de agosto/2016. Autógrafos em parceria com a escritora Mora Alves. Muitos amigos e muita alegria. Gratidão.














sábado, 21 de março de 2015

Linguagem e democracia

Cissa de Oliveira


O conhecimento se renova com muita velocidade. Há tempos ouvimos e sabemos tanto sobre isto que até nem causa mais estranhamento saber que a tecnologia que conhecemos recentemente já está ultrapassada.   

E se o conhecimento, praticado ou não, se duplica, triplica e replica numa velocidade estrondosa, por que haveria de ser diferente com as coisas da palavra? A sentida e a falada, escrita. A culta e a inculta. A rica e pobre. A certa e a errada. Errada? Até quando? Palavra é coisa viva, vai por aí, encontrando, preenchendo nichos, se estabelecendo. Ninguém manda na palavra, não, nem nos seus arranjos.

Não faz tanto tempo, a febre era a do “vou estar” alguma coisa: providenciando, verificando, olhando, averiguando, falando e até mesmo – espanto -  escrevendo ou apagando. A onda do gerúndio era um tanto cômica mas o fato é que ocupou frases cotidianas, discursos, promessas. Ações sem prazo para começar e, dependendo do caso, muito menos para terminar. Desdobramento sobre desdobramento? Ações desdobráveis, tanto quanto as linhas das costureiras, aquelas que, atualmente trabalham na costurateria...? Claro, pois se às manicures e clientes surgiram as esmalterias, se os pães nascem nas paneterias e se daqui a pouco os bebês nascerão nas bebeterias por que as costureiras não haveriam de ter vínculo com a costurateria?

E a escola, será que a ela vai ser chamada de escolateria? “... as escolaterias da diretoria sul são responsáveis por 39% da aluneteria (justo que o aluno seja tratado também enquanto classe) da Secretaria da Educateria de São Paulo...”.

Será que o vô dicionário vai suportar tanta fluidez? Pensar que a gente nem viajou além da zona de conforto do próprio linguajar! Já imaginou a palavra farofateria?   

Eu curto a democracia da palavra. Fluidez de bem prá lá do certo e do errado. Licença poética.  Talvez devesse adotá-la, pacote inteiro e definitivo no mundo da crônica.  Começarei abrindo uma pasta aqui, sob o nome croniqueteria. É feio? Mas com esse ar de indústria da escrita a fluidez bem pode rolar por aqui.  Além do mais “democrateria” ou democracia, como queiram: tudo coisa séria.

Cissa de Oliveira



domingo, 26 de outubro de 2014

Aviso






Achou-se um pensamento perdido,
rendido, rendado,
no rodado do vestido.

Achado não é roubado.

Com ele se desenharam versos d'água,
que somente serão entregues
ao verdadeiro dono.

Cissa de Oliveira


sábado, 27 de setembro de 2014

Faleceu ontem a pessoa que atrapalhava sua vida


Luis Fernando Veríssimo

Um dia, quando os funcionários chegaram para trabalhar, encontraram na portaria um cartaz enorme, no qual estava escrito:
"Faleceu ontem a pessoa que atrapalhava sua vida na Empresa. Você está convidado para o velório na quadra de esportes".
No início, todos se entristeceram com a morte de alguém, mas depois de algum tempo, ficaram curiosos para saber quem estava atrapalhando sua vida e bloqueando seu crescimento na empresa. A agitação na quadra de esportes era tão grande, que foi preciso chamar os seguranças para organizar a fila do velório. Conforme as pessoas iam se aproximando do caixão, a excitação aumentava:
- Quem será que estava atrapalhando o meu progresso ?
- Ainda bem que esse infeliz morreu !
Um a um, os funcionários, agitados, se aproximavam do caixão, olhavam pelo visor do caixão a fim de reconhecer o defunto, engoliam em seco e saiam de cabeça abaixada, sem nada falar uns com os outros. Ficavam no mais absoluto silêncio, como se tivessem sido atingidos no fundo da alma e dirigiam-se para suas salas. Todos, muito curiosos mantinham-se na fila até chegar a sua vez de verificar quem estava no caixão e que tinha atrapalhado tanto a cada um deles.
A pergunta ecoava na mente de todos: "Quem está nesse caixão"?
No visor do caixão havia um espelho e cada um via a si mesmo... Só existe uma pessoa capaz de limitar seu crescimento: VOCÊ MESMO! Você é a única pessoa que pode fazer a revolução de sua vida. Você é a única pessoa que pode prejudicar a sua vida. Você é a única pessoa que pode ajudar a si mesmo. "SUA VIDA NÃO MUDA QUANDO SEU CHEFE MUDA, QUANDO SUA EMPRESA MUDA, QUANDO SEUS PAIS MUDAM, QUANDO SEU(SUA) NAMORADO(A) MUDA. SUA VIDA MUDA... QUANDO VOCÊ MUDA! VOCÊ É O ÚNICO RESPONSÁVEL POR ELA."
O mundo é como um espelho que devolve a cada pessoa o reflexo de seus próprios pensamentos e seus atos. A maneira como você encara a vida é que faz toda diferença. A vida muda, quando "você muda".


Luis Fernando Veríssimo

domingo, 27 de julho de 2014

Uma carta uma brasa através
















uma carta uma brasa através
por dentro do texto
nuvem cheia da minha chuva
cruza o deserto por mim
a montanha caminha
o mar entre os dois
uma sílaba um soluço
um sim um não um ai
sinais dizendo nós
quando não estamos mais

Paulo Leminski

Passageiro








Por que danço?


Para ser passageiro de meu próprio corpo.


Para me esquecer. Para lembrar.


Para lhe ter.


Danço para, por instantes, ser real.

Bruno Franchi