sábado, 21 de março de 2015

Linguagem e democracia

Cissa de Oliveira


O conhecimento se renova com muita velocidade. Há tempos ouvimos e sabemos tanto sobre isto que até nem causa mais estranhamento saber que a tecnologia que conhecemos recentemente já está ultrapassada.   

E se o conhecimento, praticado ou não, se duplica, triplica e replica numa velocidade estrondosa, por que haveria de ser diferente com as coisas da palavra? A sentida e a falada, escrita. A culta e a inculta. A rica e pobre. A certa e a errada. Errada? Até quando? Palavra é coisa viva, vai por aí, encontrando, preenchendo nichos, se estabelecendo. Ninguém manda na palavra, não, nem nos seus arranjos.

Não faz tanto tempo, a febre era a do “vou estar” alguma coisa: providenciando, verificando, olhando, averiguando, falando e até mesmo – espanto -  escrevendo ou apagando. A onda do gerúndio era um tanto cômica mas o fato é que ocupou frases cotidianas, discursos, promessas. Ações sem prazo para começar e, dependendo do caso, muito menos para terminar. Desdobramento sobre desdobramento? Ações desdobráveis, tanto quanto as linhas das costureiras, aquelas que, atualmente trabalham na costurateria...? Claro, pois se às manicures e clientes surgiram as esmalterias, se os pães nascem nas paneterias e se daqui a pouco os bebês nascerão nas bebeterias por que as costureiras não haveriam de ter vínculo com a costurateria?

E a escola, será que a ela vai ser chamada de escolateria? “... as escolaterias da diretoria sul são responsáveis por 39% da aluneteria (justo que o aluno seja tratado também enquanto classe) da Secretaria da Educateria de São Paulo...”.

Será que o vô dicionário vai suportar tanta fluidez? Pensar que a gente nem viajou além da zona de conforto do próprio linguajar! Já imaginou a palavra farofateria?   

Eu curto a democracia da palavra. Fluidez de bem prá lá do certo e do errado. Licença poética.  Talvez devesse adotá-la, pacote inteiro e definitivo no mundo da crônica.  Começarei abrindo uma pasta aqui, sob o nome croniqueteria. É feio? Mas com esse ar de indústria da escrita a fluidez bem pode rolar por aqui.  Além do mais “democrateria” ou democracia, como queiram: tudo coisa séria.

Cissa de Oliveira