domingo, 3 de abril de 2011

Assombrações

Cissa de Oliveira



Atílio não era uma exceção, mas estava “por aqui” com o seu estilo de trabalho. Cotidiano de cobranças, estresses, gravata certinha e falta de tempo até pra ir ao banheiro. - Que ser humano suporta isso? - ele se perguntava, por mais que soubesse que a resposta era: pelo menos a metade dos habitantes do planeta.

No domingo o cotidiano oferecia preocupações bestas, então redemoinhos lentos escorregavam por dentro do cérebro dele, e até mesmo por fora, imitando a fumaça do charuto que ele trazia esquecido na boca. Ocupou-se do jornal.

Dados de um satélite possibilitaram que a imagem mais recente do planeta fosse estampada na manchete “Cientistas mapeiam gravidade da Terra”. Não era um globo. Não era um ovo. Uma bila? Geoide? Seria o dia das coisas feias? Virou a página. Destaque para Ozzy Osbourne que, aos 62 anos passa por Porto Alegre, coloca o público para gritar e bater a cabeça, solta pum – êta marmota de sorte! - e embarca para São Paulo. Ao que se soube, o maldito não arrancou com os dentes a cabeça de nenhuma pomba, nem de qualquer morcego.

Atílio dispensou o cachimbo e atirou o jornal pra lá. Ô dia de cão! Decidiu-se, juntamente com a mulher, a fazer um “footing”. Ela ainda calçava os tênis. Esse meio-tempo foi suficiente para que aflorasse em Atílio um forte instinto masculino ancestral; a necessidade quase inconsciente de portar algo, como uma espécie de... proteção? Não sabia bem... e muito menos pensava sobre isso com clareza. Como a idade da pedra lascada já vai longe, ele pegou o controle remoto da televisão. Apertou. Apareceu o Faustão.

Parecendo louco, Atílio correu bem umas seis voltas na pista de “cooper” mas nem isso nem nada apagou as assombrações; muito menos o fantasma da segunda-feira.

Cissa de Oliveira

Um comentário:

  1. Um gênero diferente, né? Gosto de variar tb. Gostei. Dez.
    Bjs

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