sábado, 23 de julho de 2011

O poeta Dante Milano


O Beco

No beco escuro e noturno
Vem um gato rente ao muro.

Os passos são de gatuno.
Os olhos são de assassino.

Esgueirando-se, soturno,
Ele me fita no escuro.

Seus passos são de gatuno.
Seus olhos são de assassino.

Afasta-se, taciturno.
Espanta-o meu vulto obscuro.

Meus passos são de gatuno.
Meus olhos são de assassino.

Eu tinha 15 anos quando li Dante Milano pela primeira vez. Hoje eu gosto do poema acima, mas naquela época a poesia mais marcante me pareceu ser uma que, por coincidência, se intitula Descobrimento da Poesia. Que bom reencontrá-la.

Descobrimento da Poesia

Quero escrever sem pensar.

Que um verso consolador
Venha vindo impressentido
Como o princípio do amor.

Quero escrever sem saber,
Sem saber o que dizer,
Quero escrever uma coisa
Que não se possa entender,
Mas que tenha um ar de graça,
De pureza, de inocência,
De doçura na desgraça,
De descanso na inconsciência.

Sinto que a arte já me cansa
E só me resta a esperança
De me esquecer do que sou
E tornar a ser criança.

Dante Milano


Dante Milano (1899–1991), Rio de Janeiro. Esse poeta cujo “fazer poético” parecia cravado no silêncio, por pouco não deixou de vir a público, tanto que a primeira edição de seus poemas saiu pela Editora José Olympio (1948), fruto de uma “ação entre amigos”: Queirós Lima e Manuel Bandeira, entre outros, à revelia do poeta. Pelo jeito, o silêncio dele era mais do que “recusa em se manifestar”, talvez fosse mesmo o seu método poético. Conhecido e admirado dentre artistas, intelectuais e acadêmicos, mas desconhecido do grande público. É um dos poetas representativos da terceira geração do Modernismo, muito embora não se integrasse a qualquer corrente, ou tradição na escrita da época. Em 1988 publicou “Poemas Traduzidos de Baudelaire e Mallarmé”(tradução dele). No mesmo ano recebeu o “Prêmio Machado de Assis”, concedido pela Academia Brasileira de Letras.

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